O Ciberespaço e a Cibercultura na Educação
domingo, 19 de outubro de 2014
CIBERLETRAMENTO: MULTIMÍDIA E MULTIMODALIDADE COMO PROPOSTAS DE LETRAMENTO
http://www.filologia.org.br/soletras/17sup/07.pdf
sábado, 18 de outubro de 2014
CIBERESPAÇO:A Cibercultura na Educação

por Marcelo Mendonça Teixeira
O ciberespaço, responsável pela rede global de comunicação mediada,
possibilita as relações tecnossociais atuantes na sociedade
contemporânea, ampliadas por redes sociais: uma sociedade conectada,
colaborativa, hipertextual, destituída de presencialidade física e
apoiada por interfaces da Web 2.0, mais recente, por recursos da Web
semântica e pela computação em nuvem. Outros tantos atributos são
delegados ao universo virtual, assim como os problemas que dela fazem
parte, como isolamento e sobrecarga cognitiva, informações duvidosas,
dependência e infoexclusão de milhares de pessoas que também querem
fazer parte dessa cultura global, mas que, por algum motivo, geralmente
de cunho econômico, estão longe de se tornar ciberculturais e
integrantes de alguma geração digital.
O conceito de cibercultura
A ausência de significado explícito na literatura nos condiciona ao
étimo da palavra “cibercultura”. Assim, em sentido estrito, temos o
prefixo “ciber” (de cibernética) + “cultura” (sistema de ideias,
conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e
atitudes que caracteriza uma determinada sociedade). No entanto, o
ambíguo conceito sofre variações a partir do referencial etimológico,
pois cada autor exprime uma conotação ideológica e descritiva própria
que nem sempre é compartilhada por seus pares. Desse modo, optei por
aqueles que se dedicam ao estudo das práticas tecnossociais da cultura
contemporânea e de suas novas formas de sociabilidade, comutadas do
mundo físico para o universo virtual (Teixeira, 2012a).
Pierre Lévy, ao publicar A máquina universo (1987), lapida o conceito
de cibercultura ao indagar questões pertinentes ao movimento
sociotecnocultural em que a sociedade está inserida. Segundo o filósofo,
este é um tema polêmico e multifacetado em que culturas nacionais
fundem-se a uma cultura globalizada e cibernética, envoltas no
ciberespaço e orientadas por três princípios: interconexão, comunidades
virtuais e inteligência coletiva. Trata-se de um “conjunto de técnicas
(materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de
pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento
do ciberespaço” (Lévy, 2010, p. 17). As “técnicas” condicionam as
interações sociais, mas não representam a cultura do ciberespaço, que se
incorpora no espaço virtual-cognitivo das pessoas, na partilha de
sentimentos, informações e saberes. Afinal, “a virtualização é um dos
principais vetores da criação da realidade” (Lévy, 2009, p. 18).
Desde o final da década de 1990, a introdução das tecnologias de
informação e comunicação (TICs) na educação é aceita por sistemas de
ensino em todo o mundo como uma epítome do desenvolvimento educacional
na história da humanidade. Nesse sentido, os governos nacionais têm
investido massivamente na compra de equipamentos, softwares e formação
docente contínua, à medida que surgem recursos tecnológicos inovadores.
Em situação contrária, o país é rotulado como uma nação pobre e
infoexcluída pelo International Bureau of Education, órgão da
Organização das Nações Unidas para a Educação e a Ciência (Unesco)
especializado em educação com o objetivo de facilitar a oferta de
educação de qualidade em todo o mundo. Na verdade, criou-se um estigma
globalizado que correlaciona o aparato tecnológico da escola, da
universidade ou do centro de ensino à qualidade da educação, tornando-o
sinônimo de mão de obra qualificada, mas nenhuma evidência científica
lastreia o argumento de que as TICs são decisivas na aprendizagem de
jovens e adultos, conforme Aviram (2000).
Não seriam facilitadores? Aviram propõe que o desenvolvimento mais
significativo que acompanha a revolução das TICs na educação ocorre fora
da escola, refletido na impressionante quantidade de alunos que não
estudam em casa nem pertencem a nenhum sistema formal de ensino (prática
comum no Reino Unido). Citando o caso inglês, o autor conta que os
membros da classe média acreditam que as chances para o progresso
educacional de seus filhos são maiores em casa (com o auxílio de
materiais didáticos e grupos de apoio baseados na internet) do que na
escola. O mesmo se estende à universidade, dados os milhares de alunos
matriculados em cursos de nível superior on-line. A Open University, por
exemplo, tem aproximadamente 250 mil estudantes no Reino Unido, na
Irlanda e na Europa (www8.open.ac.uk /about/main/).
O ciberespaço possibilita o autoaprendizado, facilita a interatividade e
estimula a troca de informações e saberes, mas não garante o sucesso do
aprendizado, comumente desmotivado pela falta de estímulo. Disso
decorre a importância da escola e do professor como mediadores do
conhecimento a ser construído, aliados às estratégias pedagógicas,
materiais didáticos e metodologias de ensino. Ainda assim,
particularidades por vezes desconhecidas, outrora ignoradas, fazem a
diferença quando “lincamos” educação a cibercultura. Diante disso, Lemos
(2003) indica novas possibilidades de socialização do conhecimento
através de três leis da cibercultura: lei da liberação do polo da
emissão, lei da conectividade e lei da reconfiguração.
A primeira refere-se a uma modificação no modelo de comunicação até
então vigente (meio massivo unidirecional — um para todos) e cede espaço
à comunicação interativo-colaborativa (meio pós-massivo multidirecional
— todos para todos). A máxima é “tem de tudo na internet”, “pode-se
tudo na internet”. A segunda define que a rede está em todos os lugares,
generalizada, interligando tudo a todos. Mediante a crescente
interconexão entre dispositivos de comunicação digital, amplia a troca
de informações entre homens e homens, máquinas e homens e também entre
máquinas e máquinas. A terceira é contrária à mera substituição de
práticas e favorável a seu redesenho em face das novas possibilidades
instrumentalizadas pelo ciberespaço, evitando a lógica da substituição
ou do aniquilamento dos antigos meios, já que, em várias expressões da
cibercultura, trata-se de reconfigurar práticas, modalidades midiáticas
ou espaços sem a substituição de seus respectivos antecedentes (Lima,
2011; Lemos, 2003).
Uma educação cibercultural

Para a educação, urge que implementemos mudanças no ensino tradicional,
secularmente institucionalizado, reconfigurando práticas
educomunicativas de acordo com o novo cenário sociotécnico atual, frente
à emergência de novas formas de comunicação interativa (muitos para
muitos) e da miríade de conteúdos informativos na rede. Doravante,
acompanhar a evolução midiática e fazer uso tanto dos antigos quanto dos
novos recursos comunicativos é um imenso desafio, congênere às
peculiaridades de cada contexto educativo (situações ambientais e
transformações da consciência coletiva em rede), obviamente, em sentido
figurado, tendo em vista que a alfabetização midiática não está
disponível a grande parte da população mundial.
Aos afortunados “nativos digitais” equivale a realidade mencionada: um
universo virtual que suporta o processo de criação, produção e
distribuição de produtos, informações e serviços; a inteligência
coletiva, o hipertexto e a inteligência artificial; as interfaces
síncronas e assíncronas de comunicação; as comunidades virtuais, a
colaboração em massa e a interatividade em tempo real, onde as pessoas
estão conectadas e o conhecimento é compartilhado (através de imagens,
vídeos, textos, áudios) em escala global (Teixeira, 2012b). A
cibercultura totaliza esse contexto, símbolo de um período da história
da humanidade marcado pela comunicação eletrônica e pelas mídias
digitais, influenciando, direta ou indiretamente, a educação e os modos
de ensinar e aprender.
A cibercultura também se faz presente na educação por meio de múltiplas
linguagens, múltiplos canais de comunicação e em temporalidades
distintas. As interfaces da Web 2.0, por exemplo, permitem um contato
permanente entre escola, professores, alunos e seus pares no ambiente
virtual de ensino. Sem fronteiras para o conhecimento, os conteúdos
educativos são trabalhados interativamente na comunidade estudantil, de
forma síncrona e assíncrona, com a possibilidade de produzir e
compartilhar conhecimentos colaborativamente com qualquer outro
estudante em qualquer parte do mundo.
Contudo, apesar dos evidentes benefícios para o processo de
ensino-aprendizagem, devemos repensar a influência da internet e das
novas tecnologias em nossa cultura, conscientes de seus pontos fortes e
limitações, como a falta ou a precariedade de acesso à rede. Além disso,
é fundamental avaliar a capacidade do estudante para utilizar as
tecnologias propostas como instrumento de produção de conhecimentos
transdisciplinares, e não apenas de informação, redefinindo a
racionalidade comunicativa em estratégias educacionais no ambiente
virtual.
Em outras palavras, a abstenção não é realmente uma opção para
instituições de ensino, professores e gestores educacionais, já que a
introdução das TICs na educação faz parte de uma revolução sociocultural
mais ampla e profunda que está mudando a cultura do mundo
contemporâneo. Quem deseja sobreviver profissionalmente a essas mudanças
ciberculturais não tem outra opção senão adaptar-se à época em que
vivemos, marcada por novos modos de comunicação, estilos de vida,
identidades, entretenimento, interatividade às novas formas de ensinar e
aprender.
A adaptação, porém, requer uma estratégia bem definida, com base em uma
clara compreensão da nova cultura emergente, dos valores explícitos e
objetivos educacionais, evitando o instrucionismo mecanizado. Por isso,
torna-se necessária uma literacia informática prévia entre educadores e
educandos, como meio de melhorar competências, conhecimentos, atitudes e
perspectivas sobre o futuro da aprendizagem, que é cada vez mais
colaborativa. Os consumidores tornam-se produtores e os produtores
tornam-se consumidores de conteúdos, bens e serviços, em um novo modelo
econômico planetário, sem restrições ou barreiras, induzido por um
processo contínuo de colaboração massiva (Tapscott e Williams, 2010).
Portanto, o conceito de cibercultura está em permanente transformação,
com muitas conotações, idealizadas notoriamente pelas práticas
tecnossociais da cultura contemporânea e de suas novas formas de
sociabilidade no universo virtual, ou seja, uma virtualização cultural
da realidade humana, fruto da migração do espaço físico para o virtual
mediado pelas TICs e regida por códigos, signos e relações sociais
dentro e fora dos espaços escolares.
Referências
AVIRAM, A. (2000). “Computers in the classroom” to mindful radical adaptation by education systems to the emerging cyber culture. Journal of Educational Change, v. 1, n. 4, p. 331-352, dez. 2000.
LEMOS, A. Cibercultura: alguns pontos para compreender a nossa época.
In: LEMOS, A.; CUNHA, P. Olhares sobre a cibercultura. Porto Alegre:
Sulina, 2003. p. 11-23.
LÉVY, P. La machine univers: création, cognition et culture informatique. Paris: La Découverte, 1987.
___. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2009.
___. O que é virtual? São Paulo: Editora 34, 2010.
LIMA, M. (2011). Educação na cibercultura: novas possibilidades para o ensino-aprendizagem. Disponível em: <http://revistaadmmade.estacio.br/index.php/reeduc/article/view/169/142>. Acesso em: 1º fev. 2012.
TAPSCOTT, D.; WILLIAMS, A. Wikinomics: how mass collaboration changes everything. New York: Penguin Group, 2010.
TEIXEIRA, M. Cyberculture: from Plato to the virtual universe. The
architecture of collective intelligence. Munique: Grin Verlag, 2012a.
___. As faces da comunicação. Munique: Grin Verlag, 2012b.
- Marcelo Mendonça Teixeira Mestre em Tecnologia Educativa, professor e consultor em tecnologias de informação aplicadas às plataformas de e-learning. marcelo.uminho.pt@gmail.com
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